IBGE lança novo mapa-múndi com o Sul no topo e o Brasil no centro da representação

Foto: Divulgação/Agência Brasil

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançou nesta semana uma nova versão oficial do mapa-múndi, com o Brasil reposicionado no centro e o Sul orientado para o topo da imagem. A iniciativa, que apresenta uma leitura invertida em relação às convenções tradicionais, ocorre em um momento em que o país assume protagonismo em agendas internacionais, como a presidência do Brics e do Mercosul, além de sediar a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), marcada para ocorrer em Belém, na Amazônia.

A nova representação cartográfica destaca os países que integram o Brics, o Mercosul, os de língua portuguesa e os que compõem o bioma amazônico. Também são evidenciadas cidades brasileiras com papel de destaque em eventos globais: o Rio de Janeiro, como capital do Brics; Belém, como capital da COP30; e Fortaleza, no Ceará, como sede do Triplo Fórum Internacional da Governança do Sul Global, previsto para junho.

Em vídeo publicado no site do IBGE, a diretora de Geociências do instituto, Maria do Carmo Dias Bueno, esclareceu que a inversão dos pontos cardeais não é um erro técnico, mas sim uma escolha deliberada. Segundo ela, a orientação convencional com o Norte no topo do mapa é fruto de uma convenção cartográfica que carrega viéses simbólicos e políticos. Para Maria do Carmo, a nova perspectiva visa questionar interpretações que tradicionalmente associam superioridade ao hemisfério norte.

Especialistas em geografia destacaram a importância da nova abordagem. O professor Luis Henrique Leandro Ribeiro, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), enfatizou que mapas são representações carregadas de valores, visões de mundo e interesses políticos. Segundo ele, ao destacar cidades brasileiras e posicionar o país no centro da projeção, o IBGE reforça o papel ativo do Brasil no cenário internacional contemporâneo.

Rafael Sânzio Araújo dos Anjos, da Universidade de Brasília (UnB), recordou que representações similares já vinham sendo desenvolvidas por pesquisadores brasileiros desde pelo menos 2007, e considerou o lançamento do IBGE um passo importante por conferir caráter oficial a essa visão. O professor também defendeu a proposta como instrumento de valorização simbólica e de autoestima nacional.

Leandro Andrei Beser, também da Uerj, observou que o novo mapa contribui para romper com a visão colonialista consolidada ao longo dos séculos. Para ele, ao visibilizar os países do Sul global, a nova representação amplia as possibilidades de leitura geopolítica do mundo.

João Pedro Pereira Caetano de Lima e Carolina Russo Simon, membros da Associação de Geógrafas e Geógrafos Brasileiros, explicaram que o mapa utiliza a projeção cartográfica de Eckert III, elaborada no início do século XX. Tal projeção busca um equilíbrio entre forma e área, especialmente em regiões polares, sendo adequada para fins temáticos. Os pesquisadores destacaram que toda projeção acarreta distorções, uma vez que a superfície esférica da Terra é representada em um plano.

Para Lima e Simon, a principal virtude do novo mapa está em recentrar a América Latina como protagonista de uma nova configuração geopolítica. Inspirado na obra "América Invertida", de Joaquin Torres García (1943), o mapa incita reflexões sobre o predomínio do hemisfério norte nas representações cartográficas tradicionais. Por outro lado, eles apontaram que a inversão pode causar estranhamento ao público acostumado com o modelo convencional e gerar resistência entre lideranças políticas pouco receptivas a essa mudança de perspectiva.

Os especialistas concluíram que mapas são, acima de tudo, instrumentos de poder, expressando disputas, visões de mundo e interesses estratégicos. Nesse sentido, a nova representação oficial do IBGE representa não apenas uma inovação cartográfica, mas um gesto político que reafirma o papel do Brasil como agente ativo na construção de novas ordens e relações internacionais.

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